Por Tiago Abdala
Qual seu prato favorito?
Quando essa pergunta é feita, automaticamente o leitor ativa em seu cérebro determinadas regiões responsáveis pela memória de longo prazo e logo vem a mente a imagem e, quem sabe, até mesmo o delicioso gosto do nosso prato favorito. Entretanto, em se tratando de política, a memória é curta e o gosto normalmente é amargo.
Seguindo o conceito de memória curta e gosto amargo (ou melhor, insosso), um prato “novo” surgiu no cenário político: Lula com chuchu!
Vale lembrar que durante muitos anos, Lula e Geraldo Alckmin eram inimigos mortais e, agora, por pura conveniência, são aliados na corrida presidencial.
Um grande exemplo de que o tempero ou ingrediente principal da política é a conveniência. No âmbito municipal, acompanhamos nos últimos dias o Prefeito de Patos de Minas fritar os vereadores, e servi-los de bandeja à população.
Analogias à parte, o Prefeito viralizou sua imagem às custas dos vereadores da Câmara Municipal de Patos de Minas.
Os vereadores foram cozinhados pelo Prefeito durante quase um mês. Levados em banho maria enquanto o caldo engrossava e o ódio da população em relação aos “edis” aumentava.
Edis, para quem não sabe, é um pronome de tratamento que significa: vereador, membro da Câmara Municipal.
Mas poderia ser muito bem o ingrediente principal de um prato político.
Os ingredientes estavam postos sobre a mesa: foi aprovado uma recomposição do salário para o cargo de vereadores. Recomposição salarial que não ocorria desde 2017. Essa recomposição foi feita de acordo com a legalidade, dentro do que estabelecem as normas jurídicas.
Projeto de lei aprovado na Câmara é enviado para o prefeito sancionar ou vetar. O Prefeito, como um bom cozinheiro analisou o ingrediente e viu nele grandes possibilidades.
O povo clamava por uma decisão. Achavam injusto o percentual aplicado à recomposição salarial dos vereadores. Se mobilizaram, recolheram assinaturas. Queriam que o prato não fosse servido.
Nada de aumento para os edis. Já estavam bem alimentados.
Mesmo que há algum tempo o próprio Prefeito tenha aumentado o salário de seu secretariado em uma porcentagem superior à aplicada aos vereadores, servindo um generoso complemento aos seus ganhos, e o fez de maneira ilegal, através de Decreto, sem que fosse sancionado pela Câmara dos Vereadores . Quando aos 45 do segundo tempo enviou seu veto à Casa Legislativa, usou como justificativa para o veto ao projeto de lei que recompunha o salário dos vereadores o fato de que este era ilegal.
A verdade é que não há nada de ilegal no projeto apresentado pelos vereadores. Tanto é que passou pelo crivo da competente Procuradoria da Câmara Municipal.
Mas um bom prefeito, bem como um bom cozinheiro, sabe utilizar os ingredientes que estão a sua disposição para agradar os eleitores, esses famintos.
O Prefeito deixou seu nome na boca do povo durante um mês. Ouvia os gritos virtuais pelo veto ao “aumento do salário dos vereadores”.
#Vetafalcão apareceu nas redes sociais. O Prefeito estava em alta e podia aproveitar o momento enquanto cozinhava os vereadores e se utilizar do engajamento causado para promover a sua própria imagem e de sua esposa, que provavelmente se lançará no mundo político, mas essa é outra história.
Enquanto os vereadores eram cozidos no caldeirão da opinião popular, o Prefeito observava calado o “mise en place”.
Se não sabe o que significa a expressão, dê um Google e expanda seu conhecimento.
Porque é necessário para entender que o veto ao aumento do salário dos vereadores só teve um motivo:
Populismo.
Os motivos expressos no veto são contraditórios por si mesmos e parecem ter sido elaborados deliberadamente para não fazerem sentido e justificar o injustificável.
O prefeito poderia ter vetado o aumento no primeiro dia, mas não, esperou até o último dia do prazo, ou melhor, até a última hora, porque o veto só chegou à Câmara dos Vereadores na última hora do dia, depois das 17h.
Os vereadores que vinham sendo cozinhados na esperança de uma sanção tácita, foram jogados na frigideira para terem sua popularidade fritada pela população.
Se encontram agora em uma posição difícil, porque mesmo dentro da casa legislativa, o aumento não era uma unanimidade. Pelo contrário, foi aprovado com um voto a mais do que o necessário.
Agora, os mesmos vereadores que votaram pelo aumento precisam se unir para derrubar o veto do Prefeito e fazer valer a legalidade.
Primeiro porque o veto do prefeito é baseado em argumentos jurídicos equivocados. A recomposição salarial tanto dos vereadores quanto a do Secretariado do Poder Executivo deveriam ser feitas através de lei.
Uma pergunta que deve ser feita é: porque ninguém questionou o aumento do salário dos secretários municipais, que foi feito longe dos olhares e noticiários, através de Decreto executivo, em desacordo com determinação legal?
A Constituição da República, inciso X do art. 37, determina aos Chefes do Legislativo, Executivo e Judiciário da União, Estado, Distrito Federal e Municípios, bem assim do Ministério Público e Tribunal de Contas, a obrigatoriedade de promoverem, mediante lei, a revisão geral anual da remuneração e subsídio dos servidores e agentes políticos, a saber:
‘Art. 37 […] X — a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices.’
Em razão desse comando constitucional, cuja intenção é o de repor o poder aquisitivo dos agentes públicos, respeitada a iniciativa legislativa de cada dirigente de órgãos ou poderes estatais, a revisão geral anual da remuneração dos servidores é de obrigação inafastável, calculando-se a defasagem, com base em índices oficiais, desde a última revisão.
Mas é preciso que essa seja feita por lei. Quando se cozinha ou quando se aplica a lei não é possível utilizar dois pesos e duas medidas.
Os vereadores se reúnem de maneira extraordinária nesta terça-feira (10/05), para analisar o veto do Prefeito ao projeto de lei.
Não vai ser um almoço, nem um jantar. Mas com certeza terá uma ave dentro de uma panela.
Veremos qual prato o eleitor/cidadão degustará. Porque, como dito anteriormente, quando se trata de política, a conveniência é o tempero, ingrediente ou quem sabe até mesmo o prato principal.
Só é feito aquilo que é conveniente ao cozinheiro.
São poucos os políticos que enxergam além da própria fome, do próprio interesse e são honestos consigo mesmos e com aqueles que o elegeram.
Para provar desse sabor basta analisar o que dizem e o que fazem.
Normalmente, as atitudes não acompanham as palavras.
O prefeito, que supostamente deu ouvidos a população, na verdade, só se aproveitou de uma situação